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sábado, 31 de maio de 2025

Lançada a 4ª edição da Feira Literária de Barra Grande, em Cajueiro da Praia/PI


O lançamento da IV FLIBG – Feira literária de Barra Grande, na Villa dos Poetas Pousada, no povoado de Barra Grande/ Cajueiro da Praia/PI, na quinta feira(29), contou com a presença de autoridades, como a vice prefeita da cidade, Nathália Régia, Secretária de Cultura, Marília e a Secretária de Educação do município, Elivânia Damasceno além de professores/as, escritores e escritoras e representantes de parceiros do evento como a SEDUC /PI, SEBRAE, Sesc Caixeiral, IFPI/Parnaíba. Os homenageados desta edição, a escritora Sônia Terra, enviou mensagem de agradecimento e apoio a feira e o escritor homenageado Claucio Ciarlini, compareceu ao evento .

A Coordenadora da FLIBG, Josilene Neres, destacou a importância da Feira, que vai conectar escritores e escritoras regionais de todo o país e que têm como um dos objetivos, incentivar crianças e jovens estudantes e a comunidade em geral, à leitura com diversas atividades durante três dias, além de movimentar o turismo e a economia local com a comercialização de livros, artesanato, gastronomia e rede hoteleira: “teremos a presença de grandes escritores e lançamentos de livros em rodas de conversas e palestras, contação de histórias, shows, performances literárias e a participação de escritores como o poeta piauiense que atualmente mora em São Paulo, Rubervam Du Nascimento e o poeta maranhense Fernando Abreu.

As novidades desta FLIBG incluem também o prêmio de literatura Kenard Kruel que vai contar com a premiação orquestrada pela ACADEMIA PIAUIENSE DE LETRAS, e o lançamento do livro de redações dos alunos de Cajueiro da Praia premiados na edição passada da feira, e o 2º Concurso de Redação. Josilene também citou a doação de livros e o cheque livros, por meio de parceria com a Secretaria Estadual de Educação do Piauí, um grande destaque da Feira, que segundo a escritora “vai facilitar aos alunos da rede pública a aquisição de publicações e grandes obras que muitos destes jovens não teriam condições de comprar”. A feira será em agosto e até lá muitas novidades ainda serão anunciadas, concluiu a cordenadora da FLIBG.

A IV Feira Literária de Barra Grande será realizada de 14 a 16 de agosto de 2025




Serviço:
IV FLIBG – BARRA GRANDE
14 A 16.08.2025
Contatos/Entrevistas
Edna Maciel – 86 9 8147 55 68
Josilene Neres -​86 9 8190-8097

sábado, 17 de maio de 2025

A Borda do Mar de Riatla – Diego Mendes Sousa e a reinvenção lírica do ser


A Borda do Mar de Riatla é uma travessia mitopoética que funde a memória, o mar, o mito e o amor numa só correnteza. Diego Mendes Sousa, poeta piauiense de rara sensibilidade e vasto repertório estético, confirma nesta obra sua posição de herdeiro dos transgressores da língua — à maneira de Manoel de Barros —, mas com uma lírica de densidade única, mais épica, mais luminosa.

Composto por 29 poemas divididos em dois capítulos — Borda d’Água e Altos-Mares, o livro é ilustrado com obras de Paul Gauguin, o que já indica seu temperamento estético: o exílio criativo, o desejo do longínquo, a reinvenção da beleza em territórios interiores. Mas ao contrário de Gauguin, que foi à Polinésia buscar inspiração, Diego mergulha em sua Parnaíba natal para encontrar o mar íntimo que o move. Parnaíba não é apenas lugar, é personagem, é elo genealógico, é raiz de todas as águas do autor.

No poema “Evocação da Parnaíba”, o poeta reconstrói a cidade com a matéria da memória, exaltando figuras históricas e familiares como quem ergue um altar afetivo. A Parnaíba dos vareiros, dos poetas, dos avós sábios, das ruas antigas e do cais torna-se, sob sua pena, um espaço quase mitológico, onde o tempo é cruzado com os pés calejados da infância e da perda. A linguagem é simultaneamente grandiloquente e confessional — o verso é largo, mas a emoção é funda.

A geografia poética de Riatla remete à mítica Pasárgada de Manuel Bandeira: ambas são territórios simbólicos criados pelo poeta para abrigar aquilo que o mundo real não comporta — desejos, memórias, ausências e utopias. Riatla, contudo, é mais líquida, mais fluida: mistura rio e mar, mito e memória, Altair (a musa) e Atlas (o peso do mundo). Ao contrário da Pasárgada idílica, Riatla é também um lugar de dor e saudade, como se o próprio chão se desfizesse em água — elemento central que percorre toda a obra como fonte de origem e dissolução. O verso “Eu vivo como o mar, bebendo os rios” do também piauiense R. Petit, poeta conterrâneo de Diego, condensa-se o espírito do livro: fusão, desejo, continuidade...Parnaíba...Piauí.

À Borda do Mar de Riatla é um canto inaugural, uma reza modernista, um grito sagrado. Nele, Diego Mendes Sousa mostra que é possível, mesmo no século XXI, construir uma poesia que recusa o raso, que convoca o sublime e que ancora a linguagem num novo humanismo poético.

SILVA, Marcello. 2025

Resenha Literária: O Argonauta de Si Mesmo – F. Gerson Meneses e a viagem interior do poeta


Em O Argonauta de Si Mesmo, o poeta piauiense F. Gerson Meneses convida o leitor a lançar-se em uma travessia poética profundamente pessoal e universal. Inspirado na figura mitológica dos argonautas — os navegadores da embarcação Argo, liderados por Jasão na busca pelo Velocino de Ouro — Meneses assume o leme de uma jornada interior, onde o oceano é o próprio eu, e os poemas, as ilhas, vulcões e tempestades do inconsciente.

Após o sucesso de Versos Retos de um Poeta Torto (2018), o autor volta mais maduro, mais afiado, mais visceral. Se a obra anterior já revelava um poeta de grande domínio da linguagem, aqui ele expande seus horizontes, compondo 58 poemas distribuídos em cinco capítulos: Devaneando, Natureza, Encontros, Vida e Ensaio de Cordel. São seções que, como mapas náuticos, conduzem o leitor por experiências sensoriais, filosóficas e afetivas que vão do concreto ao onírico.

A beleza plástica da obra, com arte de capa simbólica (um homem a pensar em sua embarcação solitária) e ilustrações de Jason Fontenele, reforça o tom reflexivo que permeia os versos. O prefácio, assinado por Claucio Ciarlini, escritor e historiador, aponta com precisão a força do livro: sua capacidade de provocar, comover e transformar, mantendo viva a chama crítica frente aos absurdos políticos e sociais dos últimos anos — um eco contemporâneo do que fez Carlos Drummond de Andrade em A Rosa do Povo.

Meneses homenageia paisagens, escancara memórias, fala de amor mesmo quando há dor, e nunca esquece o torrão natal — como fez Da Costa e Silva ao cantar o Piauí. Sua escrita, por vezes romântica, por vezes concreta, nunca se aparta da emoção verdadeira. A poesia aqui é resiliência, é cicatriz e também sopro de esperança. É, como escreveu Octavio Paz, “um ato vital”.

O Argonauta de Si Mesmo não é apenas um livro: é um chamado. Uma viagem que, ao término, nos faz perceber que o maior destino da poesia é o encontro com aquilo que ainda pulsa em nós — mesmo quando o mar está revolto.

SILVA, Marcello. 2025

Análise do livro "A Preparação do Escritor" de Raimundo Carrero (Iluminuras, 2000)

Detalhes da obra:
Nome: A Preparação do escritor
Autor: Raimundo Carreiro
Editora: Iluminuras
Ano: 2000
224 páginas
Tamanho: 14x21
ISBN: 978-85-7321-301-0

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Com base na obra, o narrador desempenha um papel fundamental na construção da percepção e da experiência do leitor, utilizando uma série de técnicas e estratégias para conduzi-lo através da narrativa de forma planejada, muitas vezes sutil e sem que o leitor se aperceba
O narrador trabalha diretamente com a duração psicológica do leitor, podendo acelerar ou retardar a narrativa. As cenas, por exemplo, dão velocidade ao texto, enquanto os cenários, pela beleza e fulgor, retardam os movimentos internos da obra. Esse retardamento é estratégico, indicando os caminhos da história ou do enredo e trabalhando a mente do leitor, que é naturalmente ingênuo e precisa ser seduzido e surpreendido.
Uma das principais funções do narrador é conduzir o leitor passo a passo, mesmo que este não perceba. O narrador pode preparar surpresas para o leitor, ou utilizar comentários e digressões para influenciar a crença do leitor, como no caso de Capitu, onde o narrador faz um comentário direto para levar o leitor a acreditar na traição. Na digressão, o narrador se afasta do objeto narrativo, levando o leitor por outros caminhos.
A relação entre autor e narrador é crucial, pois o autor pensa a ideia e recorre ao narrador para contar a história. O autor premedita, e o narrador conta, e essa premeditação pode ser usada para gerar dúvida no leitor. O narrador é o personagem mais importante criado pelo autor para tornar o abstrato concreto e deve usar o máximo de sofisticação para chegar ao leitor com o máximo de simplicidade. A simplicidade, aliás, causa leveza no leitor, que é conquistado e seduzido pela maravilha do texto.
O narrador age estrategicamente, muitas vezes escondendo informações do leitor para que ele as descubra no desenvolvimento do texto. Ele seduz e encanta, conduzindo o leitor pelos "olhos" da primeira leitura, que pode ser perigosa e enganosa. O mérito do novelista é esconder. Essa habilidade do narrador de parecer dizer uma coisa e levar o leitor para outra é um conhecimento secreto da intimidade da ficção. Os artificios e as estratégias são a pulsação da obra, o jogo do narrador.
A manipulação da perspectiva é uma técnica poderosa. Em Dom Casmurro, por exemplo, há uma narrativa em "falso ângulo aberto", onde o narrador duplo (Dom Casmurro e Bentinho) confunde o leitor com suas armadilhas. O ponto de vista dos dois é o mesmo (acusar Capitu), mas a técnica narrativa se divide: um acusa (Bentinho, oculto), o outro comenta e distrai (Dom Casmurro, onisciente). O narrador astuto pede a cumplicidade do leitor em suas tramas. A própria Capitu é apresentada como uma personagem de criação indireta, existindo apenas na mente de Bentinho, o que molda a percepção do leitor sobre ela. A dúvida sobre a traição de Capitu não é um problema de enredo, mas de técnica narrativa que impressiona o leitor.
Em A hora da estrela, Clarice Lispector usa o narrador Rodrigo S.M.., que conta a história e, em certos momentos, usa a voz feminina da autora. Essa inversão da voz narrativa é uma técnica sofisticadíssima que parece simples para o leitor. O narrador também dialoga com o leitor usando a segunda pessoa do plural ("vós"), criando distanciamento e cumplicidade. A escolha dos pronomes ("eu", "nós", "a gente") afeta a proximidade do narrador com o leitor.
Em O Pai Goriot, Balzac usa um narrador cronista que inicia o romance com comentários e cenários, criando uma atmosfera e pedindo uma respiração lenta e tranquila do leitor. Ele apresenta personagens e digressões para envolver o leitor sutilmente. O narrador tem um incrível onipresença e domina tudo. Balzac também utiliza a criação indireta de personagens, apresentando Goriot através dos olhos psicológicos da senhora Vauquer, o que torna o personagem complexo e capaz de surpreender o leitor.
O narrador tem ampla liberdade para mudar o foco narrativo dentro de uma mesma obra, o que aumenta a sofisticação e a adesão do leitor. Mesmo mantendo o foco narrativo (pessoa gramatical), o ponto de vista (estrutura psicológica do personagem ou do narrador) pode se alterar, mudando a percepção do leitor. O ponto de vista representa o tom que a narrativa deseja alcançar.
Além de narrar, o narrador pode permitir que outros personagens também "narrem" ao esconder informações, especialmente do narrador oculto e do leitor, seduzindo-o. Quando os olhos dos personagens se encontram, cria-se uma "narrativa por intersecção", comum a ambos, com a ajuda do narrador. O leitor, seduzido pelo narrador e pelos personagens, chega a imaginar que está também criando o texto.
A montagem da narrativa, comparada à edição de um filme, é controlada pelo narrador e influencia a emoção estética do leitor. A distribuição de cenas, diálogos e cenários, os cortes e as elipses, tudo contribui para envolver o leitor. O cenário não é apenas descrição, mas um artifício para atrair o leitor para a armadilha do narrador.
A habilidade e a sutileza do narrador são essenciais. Um bom narrador faz o leitor caminhar em várias direções, seduzindo-o através da técnica do foco narrativo e dos pontos de vista. A sutileza pode ser tanta que o leitor mal percebe a narrativa escondida em uma frase, como em Dom Quixote. O uso de títulos ambíguos também é uma estratégia para desviar a atenção do leitor, conduzindo-o para um caminho oposto sem perder o foco principal.
Em suma, a construção da percepção e da experiência do leitor é um processo estratégico e técnico realizado pelo narrador, que utiliza o controle do ritmo, a manipulação da perspectiva, a arte de esconder e revelar informações, e a interação implícita ou explícita com o leitor para seduzi-lo, surpreendê-lo, envolvê-lo emocionalmente e conduzi-lo através da história.

Tópicos Essenciais da Criação Literária, segundo Carrero:

O que distingue o narrador do autor em uma obra literária?

O texto enfatiza que o narrador não é o autor. Enquanto o autor é a pessoa que escreve a obra, o narrador é a voz escolhida pelo autor para contar a história. O narrador é visto como o "grande personagem do autor". Essa distinção é crucial, pois o ponto de vista do narrador (sua opinião, estrutura psicológica, comportamento) não necessariamente coincide com o ponto de vista do autor. A obra "A hora da estrela" de Clarice Lispector é citada como exemplo, onde Rodrigo S.M. é o narrador, representante da autora, mas não a própria Clarice.

Qual a diferença entre ponto de vista e foco narrativo?

Embora frequentemente confundidos, ponto de vista e foco narrativo são conceitos distintos. O foco narrativo refere-se à pessoa gramatical escolhida pelo narrador (primeira, segunda ou terceira pessoa), ou outras "pessoas narrativas" não reconhecidas na gramática tradicional. O ponto de vista, por sua vez, é a perspectiva, a opinião, a estrutura psicológica do personagem através de sua maneira de agir. É possível ter múltiplos pontos de vista com um único foco narrativo ou diversos focos narrativos com diferentes pontos de vista.

Como a criação de personagens pode ser abordada?

A criação de personagens não surge pronta, mas é um processo que envolve estudo, pesquisa e exercício constante. O texto sugere a observação do cotidiano, de pessoas ao redor (família, vizinhos, colegas) como fontes de inspiração. A materialização da personagem se dá através da elaboração de perfis: físico, psicológico e físico-psicológico. O perfil físico descreve características externas com precisão, por vezes com nuances literárias. O perfil psicológico foca no comportamento e reflexões internas do personagem, sem a necessidade de descrição física. O perfil físico-psicológico combina a descrição física com traços que revelam o comportamento e a profundidade psicológica.

Qual a importância do documento e da invenção no processo criativo?

O texto adverte sobre a tentação de ser meramente documental na escrita. Embora a pesquisa e o material coletado (recortes de jornais, fotos, anotações) sirvam de base e "conteúdo material", o objetivo final deve ser a invenção, a transcendência do concreto para o artístico e literário. O documento deve ceder lugar ao estético, transformando o ofício em arte. É preciso se impressionar, registrar, mas não sucumbir à cópia, buscando sempre o "absolutamente artístico".

De que forma a prática e a disciplina influenciam a escrita?

A prática constante e a disciplina são fundamentais para a criação literária. Assim como artistas plásticos e músicos se dedicam a exercícios diários, o escritor precisa escrever continuamente, mesmo sem inspiração imediata (Impulso). O texto enfatiza que a criação também pode ser dominada e tem didática. A prática ajuda a destravar o processo criativo, a encontrar a própria voz e a dominar as técnicas. É através do "escrever, reescrever, rasgar, jogar fora, destruir" que se alcança a maestria.

Como os diferentes tipos de cenário contribuem para a narrativa?

O texto cataloga quatro tipos de cenários: natural, humano, psicológico e metafórico. O cenário natural descreve o ambiente físico, muitas vezes com elementos imagéticos e comparações. O cenário humano foca nos espaços e interações sociais. O cenário psicológico reflete o estado mental e emocional do personagem no ambiente. O cenário metafórico utiliza uma imagem ou conceito para ocupar o lugar do cenário natural, sem ser uma simples comparação, mas uma substituição de significado. O estudo e o uso consciente desses diferentes cenários, em alternância com as cenas, contribuem para o ritmo e a profundão da narrativa.

O que são metáfora e símile e qual sua relevância na escrita?

Metáfora e símile são figuras de linguagem importantes para o ficcionista. O símile compara uma coisa a outra explicitamente, utilizando termos como "como" ou "parece". Já a metáfora substitui um objeto por outro, criando uma identificação direta, sem a presença de termos comparativos. O texto, citando Autran Dourado e Caetano Veloso, esclarece que a metáfora substitui com precisão o objeto, admitindo interpretações, enquanto o símile compara e fecha o ponto de vista. O domínio dessas técnicas enriquece a linguagem e a capacidade de criar imagens vívidas na mente do leitor.

Como a montagem e a pulsação narrativa afetam a experiência do leitor?

A montagem do texto, a alternância entre cenas (mais rápidas) e cenários (mais lentos), e o uso estratégico do foco narrativo e ponto de vista criam a pulsação narrativa. Essa pulsação influencia a "duração psicológica" do leitor, ou seja, a forma como ele percebe o tempo ficcional. Ao dosar a velocidade da narrativa, o autor conduz o leitor, escondendo ou revelando informações, criando expectativa e envolvimento. A escolha entre focar em uma cena detalhada (foco fechado) ou apresentar uma visão mais ampla (foco aberto, panorâmica) também contribui para essa dinâmica.

Fonte: CARRERO, Raimundo. A Preparação do Escritor. Iluminuras, 2000.