Foto: Hermeson Oliveira |
domingo, 10 de março de 2019
Ele estranhou aquelas pessoas diferentes chegando na pracinha do bairro pacato. Pessoas comunicativas e jovens com equipamentos tão estranhos. Ele observou de longe a priori. De acordo com o avançar da hora em que os jovens ligavam seus equipamentos, ele se aproximava da praça com seus passos curtos. Sempre cauteloso e observador, sentou no último banco de concreto.
Aquela pracinha tão esquecida, pequenina quase sem vida com seus sólidos cinzentos, agora uma grande imagem era projeta e a meninada chegava aos montes, esbaforida com suas curiosidades nos olhos inquietos.
− O que é isso tia, o que é... É um filme é? − Perguntou um dos meninos.
− Sim, sim é um filme muito massa, espere um pouco e já vai começar − respondeu uma das organizadoras com voz angelical.
Ele, no entanto, permanecia observando aquelas cenas, em silêncio, estranhando deveras, aquele movimento, aquela grande imagem projetada... aquele som sendo testado. Permaneceu ali.
Agora a praça já vibrava aos sons das crianças. Meninos e meninas de todo o bairro parecia estar ali querendo saber o que se passava. Tudo pronto e o filme iria começar. As crianças se acalmaram sentando em tapetes, mantas e colchas no chão. Ele aproximou mais um pouco. Em seguida mais um pouco e ficou entre as crianças. Observou a projeção e seus olhos fixaram na imagem numa mistura de curiosidade e encanto.
Ele devia ter entre 70 e 80 anos de idade. Tinha os passos curtos, porém rápidos. Ele vestia uma bermuda preta e uma camisa azul aberta e sobre sua cabeça um boné que lhe cobria os olhos pequenos. Ficou ali imóvel observando as cenas do filme animado. No seu tempo de criança, numa cidade interiorana e sem energia elétrica, certamente não tinha uma TV sequer e agora ele tinha aquela tela enorme e aqueles bichos falantes no seu colo. Naquele instante ele era apenas mais uma criança dentre as demais.
A exibição do filme “Zootopia – Essa cidade é o bicho” já estava quase na metade quando de repente ele se levanta, ajeita o boné e sai rápido da praça. Adentrou aquela rua com a penumbra das luzes fracas. Cinco minutos depois ele retorna segurando a mão de uma criança, sua neta, provavelmente. Sentou no mesmo lugar e apontou para projeção dizendo algo ao ouvido da neta. Ela riu. Eles riram. Eram duas crianças embriagada na animação. Dividiram a pipoca e o suco no seu cinema particular e a céu aberto. Ele era uma criança, sem estilingue; Era o rei de Zootopia.... Como dizia o subtítulo do filme: “aqui você pode ser o que quiser”.
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