Na praça do centro, monótono no fervilhar de pessoas que vem e vão a lugares diversos, um homem sentado no banco central, em estado avançado de embriaguez, destampa uma garrafa e toma mais um gole de um coquetel alcoólico. É março e o cheiro de álcool divide espaço com o cheiro de chuva.
O sujeito toma seu gole e acena para o vazio como se pedisse a alguém que viesse ao seu encontro. Poderia ser eu ali, sentado com toda insanidade da minha lucidez, afogado na loucura da sobriedade, acenando para meus monstros cotidianos e invisíveis.
Não. Não posso me aproximar do “sujeito homem” embriagado, tenho medo de me reconhecer nele. Sua dor pode ser a minha, seus medos podem ser os meus... Pode ser eu que esteja ali, vestido de desilusões e egos vazios, sedento por um gole de álcool que alivie meu cansaço de sóbrio.
Ele chora, bate no tórax como se quisesse arrancar algo do lado esquerdo do peito: sua dor, talvez. Mais um gole desce pela garganta ébria como uma espada afiada que aumenta o sangramento e a dor. Enquanto pessoas passam alheias àquele universo conflitante contido naquele banco central da praça, me compadeço daquela figura humana cuja face me lembra o reflexo do meu espelho.
Ele se levanta, toma seu último gole e sai cambaleante a um destino desconhecido.
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